por O Arrumadinho, em 31.03.13
Há uns anos, escrevi um texto sobre as mudanças que a chegada de um filho trazem na vida de um casal. Resolvi adaptá-lo e parti-lo em posts diferentes sobre este assunto. Aqui fica o primeiro.
Os filhos mudam tudo. Deve ser uma das frases que mais oiço a pais vividos, numa tentativa de prepararem os que esperam uma criança.
Como já sou pai posso confirmar: os filhos mudam tudo.
Mudam tudo, mas tenho a certeza de que é fácil ser-se feliz com uma nova realidade, ainda que a nova vida seja privada de tantos momentos só a dois, que podem ser substituídos por outros ainda melhores, mas a três. O mais importante de tudo é mesmo ter a noção do que se vai encontrar, perceber o que vai mudar, ter consciência do trabalho e das privações que vamos ter pela frente, e estar preparado para todo esse mundo novo.
A maior parte dos casais que se separam após o nascimento de uma criança não sabem lidar com esse mundo novo. Não o dominam – deixam-se dominar; não o enfrentam – anulam-se; não percebem que a vida deles não acabou – está apenas a começar num novo formato.
Homens e mulheres têm posturas diferentes relativamente à questão da gravidez/nascimento da criança. Já assisti a imensas discussões sobre este assunto e quase todos batem nas mesmas teclas.
Elas sentem-se mal com o corpo, porque engordaram como nunca e têm borbulhas, e tornozelos agigantados. Sentem-se mal de saúde, porque estão muitas vezes enjoadas, e inchadas e com dores de costas. Sentem-se com a auto-estima de um rato do esgoto, porque se acham feias e desinteressantes. Sentem-se amedrontadas, porque têm medo de falhar, têm medo do desconhecido, têm medo de não corresponder ao que lhes é exigido, têm medo de não saber tratar de um bebé. Sentem-se inseguras, porque acham que os parceiros já não as acham sexys e vão querer saltar para cima da colega de trabalho. Sentem-se perdidas, porque já não estão a trabalhar, mas também ainda não têm assim tanta coisa para tratar relativamente ao nascimento da criança. Sentem-se receosas, porque fazem contas à vida e começam a perceber as despesas todas que vão ter. Sentem-se pressionadas, porque os pais e os amigos estão sempre a dar palpites sobre o que elas devem fazer e não fazer.
Na verdade, tudo isto gera, muitas vezes, depressões pré ou pós-parto. Há casos, até, de depressões pré e pós parto, que podem durar por um período indeterminado. Mas como qualquer doença, também isto se cura. O problema maior é mesmo que o doente reconheça que está doente, e esteja disposto a tratar-se, o que nem sempre acontece.
Grande parte dos conflitos entre os casais que têm ou vão ter o primeiro filho advêm de algumas destas fragilidades e mutações por que o casal passa.
Ao homem cabe o papel de tentar, de alguma forma, tranquilizar a mulher, ajudar em tudo o que lhe for possível, não deixar que ela entre em pânico, continuar a dar-lhe provas de amor e, também ele, começar a preparar-se para a tal nova realidade que lhe irá, seguramente, alterar rotinas, prioridades, sonos, programas.
Só é possível superar todas as dificuldades relativas ao nascimento de uma criança se a relação entre o casal for muito forte, cúmplice e assente em amor, amizade e companheirismo. Se uma qualquer destas coisas começa a faltar, o mais provável é a torre vir abaixo. Se o amor já é fraco, ou ainda não é suficientemente forte, a vontade de parte a parte em superar tudo é muito menor. Se não há companheirismo, perde-se o respeito, e sem respeito vai-se o amor, e sem amor vai-se tudo.
Este é um jogo de equilíbrios delicado que assusta, mas que todos devem estar cientes de que existe.
Se decidimos que vamos a jogo temos, os dois, de conhecer as regras.
Próximo tópico: "os pais que se anulam", para ler amanhã, segunda-feira, dia 1, a partir das 14h.
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