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Quando a mãe grita

por A Pipoca Mais Doce, em 26.09.13

Quando dei por mim estava a gritar. Saiu-me assim, um "aaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhh", vindo do nada. Não foi bem "do nada". Foi fruto de duas horas a ouvir o Mateus berrar como nunca. Quando dei por mim estava a gritar. Foi só um grito, só um "aaaaahhhhhhhhhhh", assim mesmo, "aaaaaaaaaahhhhhhhhhh". Saiu-me. Foi involuntário. Um bocadinho alto demais. Só um grito. Ele não deu por nada. Pelo menos, nem o meu berro calou o dele. Mas saiu-me, sem querer. Quando dei por mim estava a gritar. E o meu marido, ao meu lado no sofá, olhou para mim como se eu tivesse enlouquecido. Acho até que deu um ligeiro salto, do susto. Não foi de propósito. Saiu-me. Foi o desespero, a impotência de já não saber o que fazer. Quando dei por mim... estava a gritar. E se não tivesse gritado, seguramente estaria desfeita em lágrimas. Gritei com o Mateus. Já foi há dias e ainda me dói. Porque ele não tem culpa. Porque as cólicas são umas filhas da puta que lhe arrancam um choro quase até ao sufoco. Quando dei por mim estava a gritar e não me consigo esquecer. Já lhe pedi desculpas. Já lhe expliquei que vou dar o melhor de mim para não voltar a gritar, mas acho que isso é mais ou menos o mesmo que tentar fazer dieta. A boa vontade está lá, mas nem sempre vai dar para cumprir. E isso chateia-me. Acredito que, ao longo da vida, muitos gritos me irão escapar. E tenho medo que ele não perceba. Que não perceba que nem sempre a culpa vai ser dele (às vezes também vai ser), que nós, adultos, temos vidas chatas e complicadas e que, às vezes, a tendência é para descarregar em quem está mais à mão. Gritei-lhe porque estava cansada, porque mal tinha dormido, porque já tinha tentado tudo e nada o calava, e o choro cada vez mais forte, e mais dentro dos ouvidos e do cérebro. Não que esteja à procura de desculpas para mim mesma. Gritei e pesou-me mais a mim do que ele. Nessa noite levantei-me várias vezes para o espreitar a dormir. Estiquei a mão para lhe fazer festinhas devagar, sem o acordar, mas queria mesmo era arrancá-lo do berço e obrigá-lo a falar, para dizer que não estava chateado, que já tinha passado e que eu não sou uma mãe má. Hoje fui à Fnac comprar um livro para mim e acabei por trazer um para ele. Quero começar a fazer-lhe uma biblioteca logo desde pequenino. Trouxe o "Quando a Mãe Grita", a história de uma "pinguina" que grita ao seu filho. E assusta-o tanto que ele acaba desfeito, com todas as partes do corpo espalhadas pelo mundo. O final é feliz, a mãe pinguina pede desculpa e o pinguim perdoa. Trouxe o livro, já o li ao Mateus e escrevi-lhe uma dedicatória para ler daqui a alguns anos. Porque eu até poderei gritar, mas no final serei sempre a pinguina que estará lá para os abraços e para o pedido de desculpas.

 

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publicado às 23:20


73 comentários

De Mary Silva a 26.09.2013 às 23:48

<3 <3 <3

De Isa a 26.09.2013 às 23:50

Qualquer mãe sabe o que é já ter chegado a um ponto total de desespero...sem calma, discernimento, razão ou lógica que lhe valham. Isto já me aconteceu e ao ler o texto da Pipoca fiquei de lágrima no olho e nó na garganta.

Obrigada Ana Garcia Martins...por ser como é, por ser quem é, por nos deixar partilhar o quanto baste do seu ser, da sua vida e principalmente neste caso da mãe em construção em que se tornou. Digo isto com o carinho de quem ao fim de quase 8 meses começa a achar que vai ser mãe em construção para o resto da sua vidinha e que muitas lágrimas salgadas e doces ainda estão para vir.

Passar por aqui no final de certos dias em particular é uma terapia instantânea :) Desejo um mundo de coisas boas a si e aos seus!

De catarina a 26.09.2013 às 23:51

Que comovente, não te sintas assim... força! :)

De Ana a 26.09.2013 às 23:52

Deste um grito, o desespero saiu e ele não se importou. Não te recrimines porque vais gritar muitas mais vezes. Tenho 24 anos e ainda hoje a minha mãe de vez em quando grita, comigo ou os meus irmãos... e todos nós entendemos porque mãe é mãe mas não é de ferro, e cansa-se, e desespera, e quase enlouquece mas, no final, sorri sempre para a sua cria e fica tudo bem. :) Calma. Um beijinho.

De Anónimo a 26.09.2013 às 23:54

Para as cólicas nada como Biogaia. A minha filhota só teve cólicas 1 semana.

De Entre Biberons e Batons a 26.09.2013 às 23:57

Lembro-me que a primeira vez que isso me aconteceu, chorei o dia todo no dia seguinte. Não foi seguido, óbvio, mas cada vez que me lembrava de ter gritado com aquele serzinho indefeso que estava ali e que eu amava tanto, chorava. Senti-me uma monstra. Má mãe. Mas, realmente, a privação de sono tira-nos algum discernimento. E, vistas as coisas, mais do que mulheres e mães, somos humanas!
De certeza que ele não ficou traumatizado :)
beijinhos e felicidades

De Rita Reis a 27.09.2013 às 00:01

Vi-te hoje na FNAC com os livrinhos na mão, e a espreitar as novidades das revistas cor de rosa :-) Impressionante como foste mãe há tão pouco tempo e estás tão bonita! E a franja fica-te super bem! Mãe que é mãe tem de gritar de vez em quando! Faz parte... E não vai ser por isso que ele vai gostar menos de ti :-) Beijinho e tudo de bom *

De Blog Profissão Mãe a 27.09.2013 às 00:03

Lindo desabafo e pedido de desculpas <3
Pq uma pessoa não é de ferro, mas tenta...
Sabes o primeiro teve umas cólicas desgraçadas...do segundo nem as ver :)

De ana a 27.09.2013 às 00:17

Uma escrita tão diferente...tão emotiva...sua pinguina! Isto acontece a todas e foi um desabafo de impotência que logo passou e o pequeno Mateus não deu por nada. Calmaaaa :-)

De Silvia a 27.09.2013 às 00:18

Sabe uma coisa, esse vai ser o primeiro de muitos, acredite que não está sozinha. O meu filho já tem 7 anos e acredite que de vez em quando ainda me sai um AAAAAHHHHH.... embora menos vezes... quer um truque? Descarregue na almofada, ela não sente, não ouve, e não sofre...... tanto serve para abafar os AAAAAHHHHH'S como para dar uns valentes murros e despejar tudo cá para fora (acredite que sabe mesmo bem e vai encarar as coisas com outra força), deixe o marido pensar que que está louca á vontade, porque por melhores pais que eles sejam, nunca vão compreender o verdadeiro amor de mãe nem o quanto abdicamos e sofremos pelos nossos filhos... mas sabem que mais? Vale muito a pena. O meu filho é a melhor coisa do mundo. :)

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