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De volta à preservação das células

por A Pipoca Mais Doce, em 08.10.13

No início de Junho falei aqui sobre a questão da preservação das células estaminais. Na altura ainda não tínhamos decidido se íamos fazer ou não e eu queria ouvir mais opiniões sobre o assunto. Recebi comentários de todos os géneros: há quem ache útil, há quem ache inútil, há quem não tenha grandes certezas sobre o assunto, há quem faça por ser uma espécie de seguro, há quem não faça por ter receio de estar a atrair coisas más... enfim, há opiniões para todos os gostos. No final, e depois de lermos muito e de falarmos com muitas pessoas, de várias áreas, optámos por fazer a preservação das células do sangue e do tecido do cordão umbilical do Mateus. Está feito, está feito. As células estão lá guardadinhas e espero nunca mais ter de vir a pensar no assunto. Sondámos as várias empresas disponíveis no mercado e optámos pela Crioestaminal, por ser a mais antiga a fazer recolha de células e por nos parecer bastante segura e fiável. Mas, claro, fiz 867 mil perguntas antes de avançar com o processo. Na verdade, fui ler todos os comentários que aqui me deixaram, fiz um compêndio de todas as dúvidas, e enviei uma listagem imensa de perguntas (22, para ser mais precisa). A rapidez e seriedade com que nos responderam fizeram com que decidíssemos mesmo avançar. E porque sei que há muita, muita gente com as mesmas dúvidas que eu tinha, partilho aqui algumas das respostas que podem ser importantes no processo de decisão. Peço-vos um pouco de paciência, que o texto é longo, mas parece-me bastante elucidativo:

  

1- Porquê doar a um banco privado e não a um banco público? Quais as grandes vantagens?


Bancos públicos e familiares (privados) podem existir conjuntamente sendo mesmo complementares, como tem sido demonstrado em vários países onde ambos coexistem, inclusive dentro da mesma estrutura, respondendo a necessidades diferentes. Nos bancos familiares são armazenadas amostras de sangue do cordão umbilical (SCU) para uso no próprio (utilização autóloga) ou em familiares compatíveis (utilização alogénica relacionada), enquanto nos bancos públicos são guardadas amostras de SCU, doadas pelos pais, para serem utilizadas em transplantes alogénicos (nos quais o dador das células é diferente do receptor).  A opção entre um transplante autólogo ou alogénico depende da doença. Em casos como deficiências medulares e tumores sólidos, faz se recurso às células estaminais do próprio paciente, sempre que possível, porque as amostras são 100% compatíveis e não existe risco de rejeição. Em situações de leucemias ou doenças metabólicas opta-se pela utilização de células de um dador, preferivelmente de um dador compatível no seio familiar, pois aumenta a probabilidade de sucesso do transplante. Nos bancos familiares grande parte das amostras libertadas é para utilização entre irmãos, pois é entre irmãos que é mais fácil encontrar um dador com a compatibilidade necessária para um transplante. Entre irmãos, a probabilidade de compatibilidade total é de 25%. Caso o doente não tenha acesso a uma amostra de um familiar, este poderá recorrer a um banco público. É justamente por esta razão que os bancos são complementares, podem ser usados em situação diferentes para quais isolados não teriam capacidade de resposta. Nos bancos públicos, as amostras de SCU não ficam reservadas nem para a criança, nem para a sua família e destinam-se a ser usadas em quem quer que delas necessite. Neste caso, a família não terá conhecimento do fim dado à amostra que doou. Ao doar a amostra de SCU, os pais renunciam a todos os direitos sobre as células e concordam com a sua disponibilização para qualquer pessoa. 

2- Existe algum banco público a funcionar em Portugal actualmente?

Existe, mas a recolha é feita apenas no Hospital de São João, no Porto, pelo que esta opção está disponível apenas para as mães que, durante a gravidez, estejam a ser seguidas aí. As últimas notícias publicadas sobre o banco público podem ser lidas aqui
3-  É verdade que no banco público a triagem das células é mais apurada e que no banco privado são aceites todas as células, independentemente da quantidade ou qualidade?
É verdade que a triagem é mais apurada nos bancos públicos, no entanto isso tem duas razões específicas:
    1. Os bancos públicos guardam só um número limitado de amostras. Assim sendo, optam por guardar as amostras de maior qualidade, por exemplo, com o maior número de células, provenientes de pais com uma boa história clínica e sem contaminações;
    2. Existem algumas situações, por exemplo dadores com história clínica e familiar de doença autoimune, em que a amostra nunca poderá ser utilizada para transplantes alogénicos não relacionados. No entanto, no caso de transplantes autólogos ou alogénicos familiares essa história clínica não tem impacto nos transplantes.

      Assim sendo, a diferença dos critérios de selecção são perfeitamente normais e têm uma explicação tecnico-científica fundamentada. As entidades internacionais que definem requisitos em matéria de qualidade e segurança de amostras de sangue do cordão umbilical criopreservadas, prevêem já requisitos diferentes consoante o objetivo da criopreservação seja para uso alogénico não relacionado ou para uso autólogo ou alogénico relacionado (Ex: FACT/NetCord) sem que tais diferenças coloquem em causa a qualidade das células criopreservadas. Por último, não é verdade que o bancos familiares guardem todas as amostras. Os bancos familiares regem-se por critérios de qualidade definidos pelas mesmas entidades internacionais e existe um número significativo que é rejeitado por questões de qualidade, p.ex. amostras com um número demasiado baixo de células estaminais.

 4-  A recolha pode ser feita em qualquer bebé ou há algumas limitações? Se os pais tiverem algum tipo de doença isso também pode influenciar a recolha?


Há algumas limitações. No caso de algum dos resultados dos exames à mãe de rastreio aos agentes: HIV I/II (SIDA), HBsAg (Hepatite B) e HCV (Hepatite C) ser positivo, a criopreservação não poderá ser realizada já que as amostras teriam uma utilização muito condicionada. Para além disso, os bancos privados definem a quantidade mínima de células que as amostras devem ter e acima da qual as estas são processadas para a obtenção das células que serão criopreservadas.

 

5- Há alguma hipótese, futuramente, de as células dos bancos privados poderem estar disponíveis a todas as pessoas inscritas nesse mesmo banco ou cada dador só poderá mesmo ter acesso às suas?

 

Não. As amostras guardadas em bancos privados/familiares destinam-se a uso no próprio ou em algum familiar compatível.

 

6- É verdade que se a criança vier a sofrer de uma doença genética, as células retiradas do cordão são igualmente portadoras do mesmo defeito genético e, por isso mesmo, inúteis?

 

Em alguns casos não é recomendável o uso de células do próprio, por exemplo para o tratamento de doenças do sangue e do sistema imunitário, se a pessoa tiver uma doença genética. Nestes casos deverá recorrer-se a uma amostra de outra pessoa, saudável, compatível, pois as células do próprio terão o mesmo defeito genético. No entanto, já houve recurso a células do sangue do cordão umbilical para o tratamento de uma doença genética com recurso a células do próprio e tirando partido da engenharia genética (terapia génica). Deste modo é possível corrigir o problema nas células do próprio indivíduo e usar essas mesmas células para tratar o problema em causa. A comunidade científica espera que essa prática se torne mais frequente no futuro.

 

Para além disso, as células do SCU de alguém com uma doença genética poderão vir a ser usadas pelo próprio noutras áreas, fora do contexto hematológico. Actualmente estão em curso mais de 40 ensaios clínicos com células do SCU em doenças fora do contexto hemato-oncológico, como a perda auditiva, o autismo, a paralisia cerebral, a diabetes, a displasia bronco-pulmonar e lesões da espinal medula entre outras, pelo que mesmo nesses casos o SCU criopreservado poderá vir a ser útil.

 

 

7- É verdade que há uma maior probabilidade de as células recolhidas virem a ser mais úteis a um familiar (irmão, pai) do que à pessoa  a quem foram retiradas?

 

Este é um dos grandes mitos da criopreservação. Na verdade o maior número de transplantes hematopoiéticos é autólogo, ou seja são feitos com recurso a células do próprio. Por exemplo, em caso de linfomas e tumores sólidos recorre-se, sempre que possível, às células estaminais do próprio paciente, porque as amostras são 100% compatíveis e não existe risco de rejeição. No entanto, e até ao presente, as fontes mais usadas têm sido a medula óssea (MO) e o sangue periférico mobilizado (SPM), porque como os bancos de células do sangue do cordão umbilical são relativamente recentes e as doenças que requerem este tipo de transplante surgem em adultos que não tiveram a oportunidade de criopreservar as células do seu sangue do cordão umbilical, tem sido necessário recorrer a outras fontes de células estaminais hematopoiéticas. A percepção errada existe, porque nas idades mais jovens a probabilidade de uso autólogo vs alogénico é inversa. Isto porque nas idades jovens surgem mais vezes doenças que requerem um transplante alogénico. No entanto, é importante ter em conta a vida inteira da pessoa.

 

8- Quais as aplicações efectivas e conhecidas até à data das células estaminais?

 

As células estaminais que têm tido maior aplicação clínica até ao momento são as células estaminais hematopoiéticas que se encontram no sangue do cordão umbilical (SCU), na medula óssea (MO) e no sangue periférico mobilizado (SPM). Conforme publicado, por exemplo, no site do banco público de Nova Iorque, são mais de 80 as doenças em que já foi usado sangue do cordão umbilical (à semelhança da MO e SPM). A maioria dos transplantes são para o tratamento de doenças do sangue, como leucemias, e do sistema imunitário, mas as células do sangue do cordão umbilical são também usadas no tratamento de doenças metabólicas. Mais informações aqui: http://www.nationalcordbloodprogram.org/qa/

 

Para além das células estaminais hematopoiéticas, há outros tipos de células estaminais, como as mesenquimais, que se encontram no tecido do cordão umbilical mas também no tecido adiposo. Considerando todas as fontes de células estaminais, sabe-se que estão actualmente em curso mais de 4.000 ensaios clínicos, com células estaminais de várias fontes, e o que se espera é que estes venham a proporcionar, num futuro próximo, opções terapêuticas para muitas doenças actualmente sem tratamento.

 

9- Qual a garantia de que os bancos privados não encerram entretanto? Nesse caso, o que acontece às células?

 

Ninguém pode garantir que os bancos não encerrem. No entanto, a lei estabelece mecanismos para que as amostras nunca sejam perdidas, nomeadamente todos os bancos familiares têm de ter um acordo com um outro banco (um banco backup) que assume as responsabilidade sobre as amostras no caso de falência. 



10- É mais útil transferir as células ao bebé no momento do parto ou preservá-las? Ou seja, poderá ser nocivo estar a privá-lo dessas células/sangue e suas respectivas propriedades? É possível transferir uma parte do sangue para o bebé e preservar a outra?  (Fiz estas perguntas porque uma leitora deixou o seguinte comentário: “a recolha do sangue do cordão umbilical obriga ao clampeamento e corte precoces do cordão, e eu quero que o cordão pare de pulsar naturalmente e o meu filho receba as células do sangue do cordão que é suposto receber e não serem retiradas para preservar para fins hipotéticos)

 

A recolha das células do sangue do cordão umbilical no momento do parto em nada altera os procedimentos do mesmo. O que significa que mesmo que os pais não queiram fazer a criopreservação das mesmas, a clampagem do cordão umbilical será feita nos mesmos moldes, isto é, não se espera mais tempo para clampar o cordão umbilical se os pais tiverem optado por não fazer a criopreservação das células do SCU do seu filho. Quando o parto decorre com toda a normalidade, a colheita de sangue de cordão é um procedimento simples e seguro.

 

 

11- Porque é que é pode ser vantajoso recolher também o tecido do cordão, para além das células?

 

O sangue do cordão umbilical é particularmente rico em células estaminais hematopoiéticas, as células que são capazes de repor as células do sangue, sendo o sangue do cordão umbilical considerado uma fonte de células estaminais hematopoiéticas alterativa à medula óssea. O tecido do cordão umbilical é rico num outro tipo de células: as células estaminais mesenquimais. Estas células têm características que as tornam muito interessantes para o tratamento de um leque alargado de doenças, como doenças auto-imunes, doença do enxerto contra hospedeiro, entre outras. As células mesenquimais podem ser usadas nos transplantes hematopoiéticos com o objectivo de aumentar o sucesso dos mesmos. Estas células encontram-se em estudo em diversas áreas da medicina em cerca de 40 ensaios clínicos, em doenças como a diabetes, colite ulcerosa, lúpus, artrite reumatóide, esclerose múltipla, lesões da espinal medula, entre outras. E, apesar do seu uso ser ainda experimental, há publicações científicas que têm dado conta de resultados positivos após infusões em doentes com lúpus, doença do enxerto contra hospedeiro e cirrose hepática, por exemplo.

 

12 -Qual a duração efectiva das células recolhidas?

 

A última publicação sobre a viabilidade das células estaminais criopreservadas data de 2011 e refere-se a 23,5 anos. À semelhança de outras células e tecidos que se têm mantido nas mesmas condições durante décadas, é provável que as células do sangue do cordão umbilical se mantenham viáveis durante muito mais tempo. As células e tecidos mantidos em contentores abastecidos por azoto líquido a 196ºC mantêm-se viáveis por longos períodos (em teoria, para sempre).

 

13- E é garantido que nesse período de 23,5 anos a ciência evolua ao ponto de ser possível saber com exactidão como é possível fazer um uso eficaz das células? (pergunta feita com base no comentário deixado por uma leitora: “Todos me disseram que não valia a pena, que o tempo de conservação das células em comparação com os estudos que estão a decorrer não permitem qualquer utilidade das mesmas, e portanto, resumindo e concluindo, é uma grande banha da cobra”)

 

Essa dúvida  é comum e, infelizmente, feito por uma leitura incompleta da realidade. A percepção que as células estaminais não têm qualquer utiliidade prende-se com o facto de a probabilidade de utilização ser relativamente baixa e, felizmente, a maioria das crianças que criopreservaram as células ainda não teve de as utilizar. No entanto, temos de ter em atenção dois aspectos: 

    1. As doenças tratáveis são doenças muito graves e, na ausência de tratamento, são muitas vezes fatais. As células criopreservadas podem ser o único tratamento disponível para salvar a criança. Um exemplo disso é o caso do Frederico, cuja vida foi salva com uma amostra guardada e, sem este recurso, teria sido fatal (http://www.youtube.com/watch?v=_WnaSv7RNvI)
    2. A probabilidade de utilização aumenta ao longo da vida. Até aos 70 anos uma pessoa em 220 vai necessitar de um tratamento com células estaminais hematopoiéticas (SCU, MO, SPM). As células estaminais do SCU poderão ser a melhor alternativa para o tratamento.

 Em resumo, as células do sangue do cordão umbilical têm um reconhecido valor terapêutico para um conjunto alargado de doenças, mais de 80, como dito anteriormente, nomeadamente doenças do foro hemato-oncológico. Mas esse valor poderá estender-se a aplicações fora do contexto hemato-oncológico graças aos ensaios clínicos em curso em diversas áreas. É provável que tenhamos de esperar alguns anos até que estes ensaios clínicos venham a dar resultados e desse modo permitir a aplicação fundamentada destas células noutras áreas. 

 

14- Na eventualidade de as células poderem vir a ser aplicadas num tratamento, qual o apoio dos bancos nesse sentido? O valor pago pela preservação das células cobre o tratamento das mesmas?

 

Depende do banco em causa e do contrato assinado entre o banco e os seus clientes. No caso da Crioestaminal, o apoio ao tratamento é de 20.000 €, em caso de utilização da amostra de SCU para uma das doenças actualmente tratáveis com células do SCU. 

 

15- Seria possível comentarem esta afirmação do Dr. Manuel Abecassis, responsável pela pela unidade de transplantação de medula óssea do Instituto Português de Oncologia:   "Nestes milhares de sacos de sangue congelado em todo o mundo há três casos de sucesso, portanto, não se pode dizer que não serve para nada, mas o que se pode dizer é que a probabilidade de utilização é muito baixa e, provavelmente para todos os casos, há alternativas"

 

A informação de que dispomos aponta para números diferentes. No que se refere aos bancos familiares, podemos a título de exemplo referir o caso do Cord Blood Registry, um dos maiores bancos de SCU a nível mundial, do qual já foram utilizadas 210 unidades (não sabemos a taxa de sucesso).

 

16- O Dr. Manuel Abecassis afirmou ainda que os sites das empresas privadas que se dedicam à congelação do sangue do cordão umbilical "não contêm informação correcta, rigorosa e objectiva", sendo "muito fantasiosos".

 

Infelizmente, o Dr Manuel Abecassis tem razão. Muitos bancos, especialmente os mais pequenos, já usaram abordagens questionáveis e pouco rigorosas. A Crioestaminal é contra essas tácticas e tem o maior cuidado de informar os pais sobre as vantagens e limitações, de forma, que os pais possam tomar uma decisão informada. 

 

17- É verdade que a quantidade de células recolhida só é suficiente se a criança neessitar dela até pesar 15 quilos ou ter cinco anos? (pergunta feita com base nos seguintes comentários deixados por leitoras:  essas células só têm interesse se a criança necessitar delas até cerca dos 5 anos, porque a partir desse momento, o pool de células que a criança necessita é muito maior, logo insuficientes para tratamento de, por exemplo, leucemias"; " “as células, a serem úteis, só dariam para tratamentos sistémos para crianças até aos 15 kg - cerca de 3 anos. Logo aí fiquei sem perceber porque é que os contratos eram de, pelo menos, 15 ou 20 anos. E nenhum comercial dessas empresas conseguiu explicar

 

As quantidade de células necessárias depende da doença, do peso do doente e do nível de compatibilidade entre dador e paciente. Cada amostra de SCU é única, com um determinado volume e conteúdo celular e a escolha da amostra a usar em determinado transplante está dependente da situação e em causa Há amostras que apenas poderão ser usadas em crianças, mas há outras que podem ser usadas em adultos. As amostras de SCU são usadas em adultos desde 1995 e são cada vez mais os adultos em quem tem sido usadas amostras de SCU como alternativa à medula óssea. Para além disso, estão neste momento em curso várias estudos no sentido de proporcionar a expansão das células estaminais hematopoiéticas, ie o desenvolvimento de técnicas que permitem multiplicar o número de células para utilização nos tratamentos. Espera-se que dentro de poucos anos estas técnicas sejam uma realidade, o que eliminaria todas as barreiras existentes. 

 

Como existem/vão existir doenças para quais a quantidade guardada é suficiente, é importante guardar pelo máximo tempo possível. Os contratos têm a duração até 25 anos por ser esse o período de tempo que até ao momento se conseguiu comprovar permitir a viabilidade celular após criopreservação. Como a criopreservação de células do SCU só se começou a fazer após o primeiro transplante de SCU, em 1988, ainda não há células guardadas com mais de 25 anos, por isso, para já, não é possível comprovar que é possível criopreservar células por mais tempo. No entanto, acredita-se que, pela evidência com outros tipos de células,  seja possível criopreservar por mais tempo as células, desde que mantidas em azoto a temperaturas muita baixas (-196°C), em teoria para sempre.

 

18- É verdade que o recurso às células estaminais num tratamento depende sempre de autorização médica? (pergunta feita com base num comentário deixado por uma leitora: “explicaram-me que o recurso às células estaminais preservadas só se faz depois de todas as outras formas alternativas de tratamento estarem esgotadas e mesmo assim é preciso haver autorização médica. I.e., o acesso às mesmas não depende apenas da vontade - informada, claro está - dos pais.”


O recurso ou não às celulas estaminais criopreservadas depende da práctica clínica e do médico, em particular. Nos Estados Unidos o uso das células estaminais criopreservadas para transplantes de crianças é a opção mais comum. A opção pelas células estaminais do cordão umbilical prende-se com as suas vantagens comparado com a médulo óssea. Por exemplo:

- o sangue do cordão umbilical contém um maior número de células estaminais hematopoiéticas por unidade de volume, quando comparado com o sangue periférico ou com a medula óssea (cerca de 10 vezes mais)

- menor risco de doença do transplante contra o hospedeiro (GVHD) aguda

- menor risco de infecção com agentes infecciosos


Em Portugal a utilização ainda não é um standard, mas espera-se que os médicos sigam o exemplo dos Estados Unidos como têm feito noutros casos. Relativamente à necessidade de autorização médica, é natural que tenha de existir.  Em caso de pedido de resgaste de uma amostra este terá de ser efectuado por escrito, pela(s) pessoa(s) que nesse momento for(em) o(s) titular(es) dos direitos sobre a amostra (em princípio os pais) e deverá ser obviamente acompanhado de declaração do médico assistente. 



19-  O que é a acreditação/certificação AABB?

 

A AABB é a Associação Americana de Bancos de Sangue, uma das duas entidades a nível mundial (juntamente com a FACT – Foundation for the Accreditation of Cellular Therapy) que estabelece e define critérios de qualidade específicos e mais exigentes para o processamento e armazenamento de células estaminais do cordão umbilical. A acreditação da AABB certifica que os procedimentos se apresentam em conformidade com as normas estabelecidas pela AABB no que diz respeito às fases de recolha, processamento, criopreservação, análise e distribuição das células estaminais do sangue do cordão umbilical. Esta acreditação representa a mais importante distinção ao nível da qualidade que um laboratório de criopreservação de células estaminais pode ter. 

 

 

Bom, estas foram algumas das perguntas que fiz à Crioestaminal e que foram decisivas na nossa escolha. Sinceramente, gostei da transparência com que nos responderam, sobretudo tendo em conta que algumas perguntas eram um bocadinho "incómodas". Não senti que nos estivessem a tentar vender gato por lebre, não achei que fossem excessivamente chatos ou persistentes. Esclareceram-nos, estiveram à nossa disposição no caso de surgirem mais dúvidas, e deixaram-nos completamente à vontade para decidirmos indicando-nos, inclusive, que perguntas deveríamos fazer aos bancos privados de recolha, de forma a podermos escolhr de forma segura e fundamentada. E nós decidimos avançar. Atenção, com este texto não estou, de modo algum, a querer influenciar as vossas decisões, nem estou a dizer que fazer a preservação das células é o mais acertado. Nós achámos importante e decidimos fazê-lo, mas esta é uma decisão que cabe a cada pai. Como disse no início, fizemos, está feito e não queremos pensar mais no assunto. Já está, já passou. E por pouco não íamos ficando sem células, já que no dia do parto, com aquela confusão de rebentarem as águas e irmos a voar para o hospital, deixámos o kit em casa. Lá teve o homem de voltar de Cascais para Lisboa, a abrir, e depois voltar a correr para Cascais. O kit chegou meeeeeesmo em cima da hora, um alivio.

 

Enfim, se estão a pensar se devem ou não fazer, e se estão com dúvidas sobre onde fazer, há dois factores importantes. Por um lado, a experiência (há quantos anos procedem à recolha e que provas já foram dadas na libertação de amostras para transplante). Por outro, as garantias de qualidade (autorizações (Ministério da Saúde), certificações, acreditações internacionais, etc e tal).

 

Deixo-vos algumas perguntas que devem fazer aquando da escolha de um banco familiar de recolha:

- Qual é o nível de experiência no armazenamento de amostras? Desde quando está em funcionamento? Quantas amostras têm armazenadas?

- Tem laboratórios próprios? Está autorizado pelas entidades competentes nacionais (DGS-ASST) para exercer a sua actividade?

- Tem experiência na libertação de amostras para uso clínico? Se sim, quantas amostras já foram libertadas e para que situações?

- Possui alguma acreditação específica para a criopreservação do sangue do cordão umbilical (AABB/FACT)?

- O laboratório tem algum programa de estabilidade para monitorizar, ao longo do tempo, as condições em que as amostras são armazenadas? São utilizadas amostras de clientes para esses testes?

 


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publicado às 08:02





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